quarta-feira, 5 de julho de 2017

5 decisões do Supremo Tribunal Federal de deixar qualquer constitucionalista de cabelos em pé



            As decisões do Supremo Tribunal Federal, órgão máximo do Judiciário brasileiro, estão bastante em voga na atualidade, principalmente por ocasião da Operação Lava-Jato, que mostrou ao país o cenário de crime que grandes empreiteiras e políticos de renome tinham por trás das câmeras. Assim, com o intuito de parar os crimes cometidos com dinheiro público, o Supremo Tribunal Federal foi chamado vez ou outra para interceptar os crimes; entretanto, vez ou outra, nos últimos anos, o STF deu decisões – principalmente em casos envolvendo a Operação Lava-Jato, mas não se restringindo a ela – ao arrepio da lei, atropelando direitos e determinações legais, em prol do “interesse público”. Confira agora 5 decisões do Supremo Tribunal que deixam qualquer constitucionalista de cabelo em pé:

            P.S.: Vale salientar que não defendemos nenhum partido ou político. Entendemos que, se há denúncia de cometimento de crime por parte de um partido ou político, que a denúncia seja investigada e, se for o caso, a pessoa física presa por seus atos, mas dentro da legalidade. Não se conquista as coisas atropelando direitos.

1 – Prisão do Delcídio do Amaral

            O ex-senador Delcídio do Amaral foi preso no dia 25 de novembro de 2015 acusado de comprar o silêncio do ex-diretor internacional da Petrobrás Nestor Cerveró, tendo, portanto, supostamente cometido o crime de embaraçar investigações de crimes cometidos por organização criminosa (art. 2º, § 1º da Lei 12.850/13).
            Todavia, o grande problema era que, quando o Delcídio foi preso, ele era senador. E, conforme o art. 53, § 2º da Constituição Federal determina, um parlamentar não pode ser preso, senão em flagrante delito em crime inafiançável. Segundo o Supremo Tribunal Federal, o crime de embaraçar investigações de crimes cometidos por organização criminosa era crime permanente, portanto, ele ainda estava em flagrante, decretando-se assim sua prisão preventiva. Só há dois poréns: um, o crime alhures não é inafiançável, então ainda esbarra na vedação da Constituição Federal; dois, a prisão em flagrante não pode ser decretada pelo magistrado e tem duração máxima de 24 (vinte e quatro) horas (art. 310 do CPP), o que não foi o caso. Essa decisão foi uma aberração tanto para os constitucionalistas quanto para os criminalistas.

2 – Impedimento do Lula como Ministro da Casa Civil

No dia 16 de março de 2016, o ex-presidente Lula foi nomeado Ministro da Casa Civil pela então Presidente da República Dilma Rousseff, tendo sido sua nomeação alvo de inúmeros processos de Ação Popular que visavam impedir sua posse. No dia 18 de março, o Ministro do STF Gilmar Mendes, monocraticamente, impediu a posse, por entender que a nomeação visava dar o ex-presidente foro privilegiado, impedindo, em tese, investigações sobre si.
Primeiramente, vale salientar que Ministros podem ser normalmente investigados. Vide os inúmeros Ministros atuais que carregam inquéritos nas costas – incluindo Moreira Franco, que também teve sua nomeação questionada judicialmente. Dissertar que dar foro privilegiado ao ex-presidente é impedir investigações sobre si é dizer que o órgão que o investiga – o próprio STF – é incompetente, deixando cair na impunidade. Segundo, Ministro não tem imunidade, como possuem os parlamentares e o Presidente da República. Se um investigado e até condenado criminalmente pode assumir o cargo de parlamentar, também pode ser nomeado Ministro.
Por fim, entendemos que os juízes de primeira instância poderiam dar liminares impedindo a posse do ex-presidente Lula, mas não o STF. As ações em primeira instância foram dadas em Ação Popular, que podem visar anulação de atos lesivos à moralidade administrativa (art. 5º, LXXIII da Constituição Federal), mas não as ações apresentadas no Supremo Tribunal Federal pelos partidos PSDB e PPS, que são mandados de segurança, que visam assegurar direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça. (art. 1º da Lei 12.016/09). Já os mandados de segurança coletivos (art. 21 da referida lei), podem ser impetrados por partido político com representação no Congresso Nacional, desde que seja para defesa de seus interesses legítimos relativos a seus integrantes ou à finalidade partidária, o que não é o caso.
Dessa forma, mais uma aberração jurídica proferida pelo Supremo Tribunal Federal.

3 – Afastamento dos deputados Eduardo Cunha e Rodrigo da Rocha Loures e do senador Aécio Neves dos seus mandatos como parlamentares

No dia 5 de maio de 2016, o ex-Ministro Relator da Operação Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal Teori Zavascki deu, em caráter liminar, e o plenário do STF ratificou a posteriori o afastamento do deputado Eduardo Cunha do mandato de deputado, afastando também do cargo de Presidente da Câmara dos Deputados, por, supostamente, utilizar o cargo para interferências no seu processo disciplinar e nas investigações criminais da Operação Lava-Jato. Por mais louvável que a decisão tenha sido, essa também é uma aberração jurídica.
Como bem sabemos, a Constituição Federal determina a separação dos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, não podendo um poder interferir na atuação do outro, exceto nos casos trazidos pela própria Carta Magna (art. 2º). Não existe permissão legal para que o Judiciário afaste preventivamente um parlamentar de suas funções; dessa forma, tal decisão encontra óbice no próprio Princípio da Separação dos Poderes, sendo, assim, outra aberração jurídica.
Da mesma forma, em 18 de maio de 2017, na Operação Patmos, desdobramento da Operação Lava-Jato, os parlamentares Rodrigo da Rocha Loures e Aécio Neves também foram afastados de suas funções, pois foram acusados de receber dinheiro da empresa J&F de forma indevida. Novamente, por mais louvável que tenha sido as decisões e por piores que tenham sido os motivos, novamente não há base legal para os referidos afastamentos.

            4 – Réus em processo criminal não podem estar na linha sucessória da Presidência da República

            Entendeu o Supremo Tribunal Federal em 2016 que aqueles que réus em processo criminal não podem estar na linha sucessória. Dessa forma, o Ministro do STF Marco Aurélio de Mello afastou, em caráter liminar, o então Presidente do Senado Renan Calheiros de sua função como presidente, no dia 5 de dezembro do mesmo ano.

            Dessa vez, a nosso ver, houve uma confusão interpretação do Supremo Tribunal Federal quanto aos §§ 1º e 2º do art. 86 da Constituição Federal. Segundo estes parágrafos, o Presidente da República, uma vez réu em processo criminal perante o STF ou de processo de impeachment no Senado, ele ficará afastado de suas funções enquanto perdurar o processo ou, se não for concluído o processo, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias.

            Entendeu o STF que o afastamento cautelar determinado pelo art. 86 da Constituição Federal era por ocasião da moralidade administrativa e que, portanto, réus que estão na linha sucessória e que podem chegar, um dia, à Presidência da República não poderiam continuar nos seus mandatos, devendo ser afastado. Primeiramente, fere de morte o Princípio da Separação dos Poderes, pelos motivos já trazidos anteriormente. Segundo, o afastamento cautelar não é só por ocasião da moralidade administrativa, mas também – e principalmente – para que o Presidente acusado possa se dedicar à sua defesa sem colocar em xeque o andamento do país – tanto que ele volta ao final de 180 (cento e oitenta) dias, se o processo não for concluído.

            Ao final, o plenário do Supremo Tribunal Federal, no caso do ex-Presidente do Senado Renan Calheiros, resolveu que réus em processo criminal podem ficar na linha sucessória, mas que, se forem assumir a Presidência, os “pulam” na linha, passando para o próximo, consertando mais uma aberração jurídica trazida pelo STF.

5 – Cumprimento de pena com condenação em segunda instância

            Por fim, também a que gere mais discussões dessa lista, pois gerou e gera até mesmo dentro do próprio Supremo Tribunal Federal. No dia 17 de fevereiro de 2016, o STF determinou a possibilidade de cumprimento de pena quando da condenação em segunda instância, não precisando esperar o julgamento de todos os recursos.
            Tal decisão causou arrepios aos criminalistas e constitucionalistas de plantão, pois foi relativizado um dos principais direitos fundamentais da pessoa humana e um dos alicerces da democracia, que é a Presunção da Inocência (art. 5º, LXII da Constituição Federal). Ora, é um direito fundamental que só se comece o cumprimento da pena quando do esgotamento total de discussão do mérito da sentença condenatória – ou seja, com o seu trânsito em julgado. E direitos fundamentais não podem ser relativizados ou abolidos, devendo ser cumpridos à risca, tal qual foi elaborado (art. 60, § 4º, IV da Constituição Federal). E se alguém, condenado em primeira e segunda instância, é absolvido no Superior Tribunal de Justiça ou até mesmo no próprio STF? Como que fica sua situação?
            Tal decisão foi tomada, data maxima venia, porque o Supremo Tribunal Federal sabe de sua ineficiência, e do STJ, para julgar causas. Não é muito raro vermos que um processo demore anos para ter seu julgamento finalizado, pois “travam” quando vão para os Tribunais Superiores. E, como no processo criminal a prescrição corre mesmo dentro do processo, acabam por inúmeros crimes ficarem prescritos durante o curso do processo. Como isso desperta a sensação de impunidade na população, o STF, ao invés de melhorar o seu desempenho, “joga a culpa” nos recursos e, com apoio popular, consegue relativizar um importante Direito Fundamental, que não poderia, jamais, ser relativizado. E acaba por vir parar na nossa lista.
           
P.S.: Relativização do foro privilegiado

Essa pauta vem de brinde porque ainda não foi julgado completamente pelo Supremo Tribunal Federal. Há um julgamento, em curso no STF, que pretende relativizar a aplicação do foro privilegiado, para que se aplique apenas aos crimes cometidos durante o exercício do mandato e se estiver relacionada com as funções desempenhadas no cargo.
Novamente, o STF está relativizando normas constitucionais em prol do suposto interesse público. Entretanto, conforme discutimos aqui: 
<http://picondecarvalhoadv.blogspot.com.br/2017/05/a-necessidade-de-manutencao-do-foro.html>, onde trouxemos mais detalhes, o foro privilegiado é importante, não podendo ser relativizado ou retirado, sob pena de perpetuar a impunidade. É outra manobra do STF para, vendo sua incompetência em julgar rapidamente os processos, realiza com apoio popular, sem participação do Poder Legislativo, competente para o caso, retirar de suas mãos inúmeros processos que acabariam prescritos por sua incompetência. E novamente vem parar aqui na nossa listinha...

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