segunda-feira, 21 de agosto de 2017

Função das Prisões Cautelares



            Nos dias atuais, o que mais ouvimos falar é das prisões cautelares. Como garantia da ordem pública, possuem tais prisões a função de manter o réu preso para que sua liberdade não ponha em risco a sociedade, o bom andamento do processo, inquérito ou o cumprimento da sentença, por prazo determinado ou até a sentença transitada em julgado – para, enfim, caso seja condenado, ser preso para cumprimento da pena a ele imposta. As prisões cautelares, no Brasil, são duas: a prisão temporária, estipulada na Lei 7960/89, e a prisão preventiva, estipulada no art. 312 e ss. do Código de Processo Penal.
            A prisão temporária possui como condão manter o agente preso quando imprescindível à investigação do inquérito policial (inciso I do art. 1º da Lei 7960/89); quando não houver elementos necessários à sua identidade ou não tiver residência fixa (inciso II) e quando houver provas fundadas da participação ou autoria dos crimes de homicídio doloso, sequestro ou cárcere privado, roubo, extorsão, extorsão mediante sequestro, estupro, epidemia com resultado morte, envenenamento de água potável ou substância alimentícia ou medicinal com resultado morte, quadrilha ou bando, genocídio, tráfico de drogas ou crimes contra o sistema financeiro (inciso III e suas alíneas) e terá validade de cinco dias (art. 2º), prorrogáveis por mais cinco (ou trinta, no tocante aos hediondos; art. 2º, § 4º da Lei 8072/90).
            Já a prisão preventiva será decretada pelo juiz quando for necessária a manutenção da prisão do agente para garantir a ordem pública, a ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, para assegurar a aplicação da lei penal (art. 312 do Código de Processo Penal) ou no descumprimento de medida cautelar (Parágrafo Único do art. 312) e ocorrerá nos crimes dolosos com pena privativa de liberdade máxima superior a quatro anos, se o agente for reincidente ou se o crime envolver violência doméstica e familiar contra mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou deficiente, para garantia a execução das medidas protetivas de urgência (art. 313).
            Portanto, tanto a prisão temporária quanto a prisão preventiva possuem requisitos a serem analisados no caso concreto, para que sejam decretadas. A liberdade é a regra – a prisão é a exceção. Tal regra é uma ramificação do Princípio da Presunção de Inocência esculpido no art. 5º, LVII da Constituição Federal, que determina que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença condenatória. Ora, se o agente só será considerado culpado ao final do processo, por que a prisão anterior dele? As prisões cautelares, como o próprio nome já diz, possuem como função manter a cautela contra agentes cuja liberdade seja considerada “perigosa”, pois poderá voltar a delinquir, evadir do cumprimento da sentença ao final, atrapalhar o decurso das investigações ou do processo – coagindo testemunhas, por exemplo, dentre outros.
Quando a liberdade do agente é considerada perigosa para a sociedade, para o bom cumprimento da sentença, para o bom andamento do processo ou para a investigação criminal, pode ser decretada a sua prisão, de forma cautelar. Cessada os motivos de sua decretação, deverá a mesma ser revogada.  Não é como uma antecipação de pena. A vida real não é como nos filmes e novelas que, descoberto o autor do crime, este é preso e fica na prisão, enquanto os mocinhos vivem felizes para sempre – até porque um dia ele será libertado. Deve-se salientar que tal medida é extremada tendo em vista que a decretação de prisão cautelar e posterior absolvição do réu não é erro judiciário para fins de indenização do agente preso indevidamente. Ou seja, se um agente for preso preventivamente pelo possível cometimento de um crime e depois é absolvido, não terá direito a indenização pelo tempo que ficou preso preventivamente e não será ressarcido do tempo que ficou preso indevidamente, por motivos lógicos. Assim, as prisões cautelares devem ser utilizadas apenas em último caso, quando esgotadas outras formas de prevenção – como as medidas cautelares do art. 319 do Código de Processo Penal e a fiança. E todos podem ficar tranquilos: deixar o réu livre agora não quer dizer que ele deixará de ser processado e, se de fato autor do crime, condenado, onde ali será preso enfim.

sexta-feira, 4 de agosto de 2017

Reforma Trabalhista

            A Reforma Trabalhista foi aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente Michel Temer, transformando-se na Lei 13.467/17 e alterando consubstancialmente a CLT, de 1943.
            A CLT foi criada como uma união de legislações trabalhistas esparsas, trazidas pelo governo getulista. Durante o Estado Novo, o Getúlio Vargas outorgou o Decreto-Lei 5452, no 1º de maio de 1943, decretando-se a Consolidação das Leis Trabalhistas, com início de vigência em 10 de novembro do mesmo ano.
            Com o passar dos anos, grande parte da população – principalmente os empresários – começou a defender a tese de que a CLT é muito engessada, impedindo uma negociação direta entre empregados e empregadores, ou entre sindicatos patronais e de empregados. Com isso, criou-se a ideia da necessidade de modificação da CLT principalmente para salvaguardar empregos, aumentada com o início da crise econômico-política a que vivemos – aprovada pela Reforma Trabalhista.
            A principal modificação trazida pela Reforma Trabalhista foi o desengessamento da CLT, permitindo que as convenções coletivas sobreponham sobre a lei em questões como, dentre outros (art. 611-A):

Art. 611-A – [...]
I - pacto quanto à jornada de trabalho, observados os limites constitucionais; 
II - banco de horas anual;  
III - intervalo intrajornada, respeitado o limite mínimo de trinta minutos para jornadas superiores a seis horas;  
IV - adesão ao Programa Seguro-Emprego (PSE), de que trata a Lei no 13.189, de 19 de novembro de 2015
V - plano de cargos, salários e funções compatíveis com a condição pessoal do empregado, bem como identificação dos cargos que se enquadram como funções de confiança; 
VI - regulamento empresarial;
 VII - representante dos trabalhadores no local de trabalho; 
VIII - teletrabalho, regime de sobreaviso, e trabalho intermitente;  
IX - remuneração por produtividade, incluídas as gorjetas percebidas pelo empregado, e remuneração por desempenho individual;  
X - modalidade de registro de jornada de trabalho;  
XI - troca do dia de feriado; 
XII - enquadramento do grau de insalubridade; 
XIII - prorrogação de jornada em ambientes insalubres, sem licença prévia das autoridades competentes do Ministério do Trabalho;  
XIV - prêmios de incentivo em bens ou serviços, eventualmente concedidos em programas de incentivo;  
XV - participação nos lucros ou resultados da empresa. 
            Ficam mantidos, sem a possibilidade de flexibilização, os direitos trazidos pelo art. 611-B da CLT:

Art. 611-B – [...]
I - normas de identificação profissional, inclusive as anotações na Carteira de Trabalho e Previdência Social;  
II - seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário;  
III - valor dos depósitos mensais e da indenização rescisória do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS);  
IV - salário mínimo;  
V - valor nominal do décimo terceiro salário; 
VI - remuneração do trabalho noturno superior à do diurno; 
VII - proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa;  
VIII - salário-família;  
IX - repouso semanal remunerado; 
X - remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em 50% (cinquenta por cento) à do normal; 
XI - número de dias de férias devidas ao empregado; 
XII - gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal;  
XIII - licença-maternidade com a duração mínima de cento e vinte dias; 
XIV - licença-paternidade nos termos fixados em lei; 
XV - proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei; 
XVI - aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei; 
XVII - normas de saúde, higiene e segurança do trabalho previstas em lei ou em normas regulamentadoras do Ministério do Trabalho;  
XVIII - adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas;  
XIX - aposentadoria;  
XX - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador;  
XXI - ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho;  
XXII - proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador com deficiência; 
XXIII - proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito anos e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos; 
XXIV - medidas de proteção legal de crianças e adolescentes;  
XXV - igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso;  
XXVI - liberdade de associação profissional ou sindical do trabalhador, inclusive o direito de não sofrer, sem sua expressa e prévia anuência, qualquer cobrança ou desconto salarial estabelecidos em convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho; 
XXVII - direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender;  
XXVIII - definição legal sobre os serviços ou atividades essenciais e disposições legais sobre o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade em caso de greve; 
XXIX - tributos e outros créditos de terceiros;  
XXX - as disposições previstas nos arts. 373-A, 390, 392, 392-A, 394, 394-A, 395, 396 e 400 desta Consolidação. 
           
No primeiro caso, a Justiça do Trabalho poderá atuar somente se houver ilicitude no cumprimento das formalidades necessárias para a convenção coletiva, não se permitindo o julgamento do mérito (art. 8º, § 3º c/c art. 611-A, § 1º, ambos da CLT).  
            Entretanto, a Reforma Trabalhista também modificou outras situações existentes na CLT. A primeira delas é a proibição de considerar como hora extra o tempo que o empregado fica dentro da empresa para se proteger de eventos climáticos, para descanso, lazer, estudo, troca de roupa, higiene pessoal, dentre outros, bem como o período em que o empregado esteja em transporte fornecido pela empresa – as chamadas horas in itinere, anulando-se a Súmula 90 do TST, que dispõe sobre o assunto (art. 58, §2 º da CLT).
            Quanto à Carteira de Trabalho e Previdência Social, aumentou a multa para empregados não registrados, que passou de 1 salário-mínimo (atualmente R$ 937,00) e passou para R$ 3.000,00 (três mil reais) – com exceção das microempresas e empresas de pequeno porte, que ficou fixado em R$ 800,00 (oitocentos reais) -, dobrando-se em caso de reincidência.
            Na nova legislação trabalhista, ficou permitida a jornada de trabalho de 12x36, mediante acordo individual ou coletivo de trabalho, convenção coletiva, podendo ser indenizados os intervalos para repouso e alimentação e cuja remuneração mensal abrange os pagamentos do descanso semanal remunerado e pelo descanso em feriados, sendo considerados compensados os feriados e as prorrogações de trabalho noturno.
            Criou-se, na Reforma Trabalhista, a figura do teletrabalho. Segundo o art. 75-B da CLT, considera-se teletrabalho “a prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação que, por sua natureza, não se constituam como trabalho externo”, que deverá ser fiscalizado pelo empregador e que não há necessidade de cumprimento da jornada de trabalho do art. 58 e ss. (art. 62, III, ambos da CLT)
            Em relação às férias, o novo art. 134 permitirá que, havendo concordância do empregado, poderá fracionar as férias em até 3 (três) períodos, sendo que um deles não poderá ser inferior a 14 (catorze) dias e outros não poderão ser inferior a 05 (cinco) cada – e não mais em 02 (duas) vezes apenas. Da mesma forma, foi revogada a norma que impedia que menores de 18 (dezoito) e maiores de 50 (cinquenta) anos fracionassem suas férias.
            Na Reforma Trabalhista, foi permitida a possibilidade de reparação de danos de natureza extrapatrimonial que, segundo o art. 233-B da CLT, é “a ação ou omissão que ofenda a esfera moral ou existencial da pessoa física ou jurídica, as quais são as titulares exclusivas do direito à reparação.” – ou seja, todo bem da pessoa física (art. 223-C) ou jurídica (art. 223-D) que possa sofrer lesão por ato comissivo ou omissivo da outra parte, como a honra, imagem, sexualidade, saúde ou lazer do empregado e marca, imagem, nome ou segredo da empresa. Será requerida judicialmente, perante a Justiça do Trabalho, e será analisada as circunstâncias do art. 223-G e a tabela do § 1º do mesmo artigo.
            Além disso, ficou permitido que grávidas laborem em condições insalubres, desde que as atividades não sejam em grau máximo – lembrando que o grau de insalubridade pode ser regulado por acordo ou convenção coletiva (art. 611-A, XII da CLT) –, a menos que um médico de confiança da gestante – ou da lactante, em qualquer grau – recomende o afastamento mediante atestado de saúde. E, se a mulher for afastada do local de insalubridade por gestação ou lactação e não puder trabalhar em local salubre, será considerada gravidez de risco e receberá salário-maternidade.
            Criou-se, na Reforma Trabalhista, o contrato de trabalho intermitente, quando a prestação de serviços não é contínua, alternando-se em períodos de prestação de serviços e de inatividade, na qual se regulará conforme o novo art. 452-A da CLT.
Além disso, foi modificado o art. 477 da CLT, cujo § 1º determinava a obrigatoriedade de a homologação da rescisão contratual ser feita no sindicato da categoria para contratos superiores a 01 (um) ano, não mais subsistindo tal obrigatoriedade. Além disso, foi modificado o seu § 6º, que determinava que o empregador tinha o prazo de 01 (um) dia útil para pagar as verbas rescisórias, ao final do contrato de trabalho, ou 10 (dez) dias corridos, caso o aviso prévio fosse indenizado. Agora, em qualquer caso, o prazo é de 10 (dez) dias, mesmo prazo para entrega da documentação referente à homologação aos órgãos competentes.
Criou-se, ainda, mais uma modalidade de demissão por justa causa, onde passará a ser permitida a extinção do contrato de trabalho por justa causa quando há perda, por parte do empregado, da habilitação ou dos requisitos estabelecidos em lei para o exercício da profissão, em caso de conduta dolosa do empregado – ou seja, em caso de culpa, não há possibilidade de extinção do contrato de trabalho por justa causa.
Ainda sobre extinção do contrato de trabalho, foi permitido, em partes, o acordo existente entre empregado e empregado – quando o empregado quer sair, devolva o valor da multa do FGTS para o empregador e recebe o seguro-desemprego. Não será permitido nos mesmos moldes, continuando a ser estelionato contra a Administração Pública, mas será permitido o acordo, onde o empregado terá direito à metade o aviso prévio, se indenizado, e a indenização de 40% (quarenta por cento) sobre o saldo do FGTS, além de ser permitido sacá-lo até 80% (oitenta por cento) do valor total – não sendo, contudo, permitido, o saque do Seguro-Desemprego.
A Reforma Trabalhista criou, também, a possibilidade de se pactuar cláusula compromissória de arbitragem, por iniciativa do empregado ou mediante sua concordância, conforme Lei 9.307/96, para os contratos individuais de trabalho cuja remuneração seja superior a 02 (duas) vezes o limite máximo estabelecido para os benefícios do Regime Geral de Previdência Social. Além disso, é permitido aos empregados e empregadores firmar o termo de quitação anual de obrigações trabalhistas, perante o sindicato dos empregados da categoria. Assinado o termo de quitação, presume-se que todas as verbas trabalhistas constantes no período do tempo tenham sido pagas, não podendo ser cobradas posteriormente – exceto se comprovar que houve fraude ou coação.
Permitiu-se também, com a nova lei, a criação de uma comissão para representação dos empregados em empresas com mais de duzentos empregados, com a finalidade de promover-lhes o entendimento direto com os empregadores, representando os empregados perante a Administração da empresa, aprimorar o relacionamento entre empresa e empregados, dentre outras esculpidas no novo art. 510-B da CLT.
Já em relação aos sindicatos, passou-se a ser facultativa a cobrança da contribuição sindical de 01 (um) dia de serviço no mês de março de cada ano, conforme nova redação dos art. 582, 583, 587 e 602 da CLT.

Por fim, há as modificações trazidas no processo trabalhista, ainda dentro da CLT, a qual traremos em outro tópico, à parte.

sexta-feira, 28 de julho de 2017

Mudanças advindas pela Lei de Terceirização (Lei 13.429/17)



A Lei de Terceirização foi aprovada no dia 31 de março deste ano, recebendo o número 13.429/17 e entrando em vigor no mesmo dia de sua publicação – ou seja, desde o dia 1º de abril deste ano a terceirização e o trabalho temporário é regido pela nova lei. E você sabe como funciona a nova lei?
            A Lei 13.429/17 modificou de forma consubstancial a Lei 6019/74, que tratava, até então, do trabalho temporário, passando a abranger a terceirização com o advento da Lei de Terceirização. Antigamente, a terceirização não era regulada por nenhuma lei, sendo apenas regulada pela Súmula 331 do TST, que regulamentava a terceirização dentro do Poder Judiciário – uma vez que súmula não vinculante não afeta outros Poderes do Estado. Com o advento da nova legislação, a matéria passou a ser tratada por lei escrita e que vigora com efeitos erga omnes (ou seja, para todos).
            Como sabemos, a Lei 6019/74 trata de trabalho temporário de pessoas físicas a uma empresa para atender à necessidade transitória de substituição de seu pessoal regular e permanente ou à acréscimo extraordinário de serviço, na contramão do contrato por prazo determinado do art. 443 da CLT, como o contrato de experiência. Com o advento da nova lei, o trabalho temporário passou a ser exercido por pessoas físicas contratadas por uma pessoa física ou jurídica, denominada empresa de trabalho temporário, para exercer temporariamente serviço, de natureza transitória de substituição de seu pessoa regular e permanente, acréscimo extraordinário de serviço ou de demanda complementar de serviços, para uma empresa denominada tomadora de serviços.
            Assim, ao contrário dos contratos por termo determinado existentes na CLT[1], o trabalho temporário é exercido atualmente por uma empresa que contrata pessoas para trabalhar dentro de outra pessoa, de forma temporária. Conforme o novo art. 6º, a empresa de trabalho temporário deve possuir os seguintes requisitos, apresentados no Ministério do Trabalho: I – prova de inscrição no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ); II – prova de registro na Junta Comercial; III – prova de possuir capital social de, pelo menos, R$ 100.000,00 (cem mil reais).
            A empresa de trabalho temporário será responsável pelas obrigações previdenciárias e trabalhistas dos seus trabalhadores, enquanto que a tomadora de serviços será responsável por cuidar da segurança, saúde e salubridade do trabalhador temporário e poderá contratar a empresa de trabalho temporário para alocar funcionários temporários tanto para suas atividades-meio quanto para suas atividades-fim, o que a lei era completamente silente até então.
            A nova legislação determina ainda que não haverá vínculo de emprego entre a empresa tomadora de serviços e os trabalhadores contratados pelas empresas de trabalho temporário e que o contrato, com relação ao mesmo empregador, não poderá exceder o prazo de 180 (cento e oitenta) dias, consecutivos ou não, prorrogáveis por mais 90 (noventa). Quando findar o prazo, o trabalhador não poderá ser colocado à disposição novamente pela mesma tomadora de serviços com novo contrato temporário, exceto após 90 (noventa) dias do término do contrato anterior, sob pena de caracterizar vínculo empregatício com a tomadora de serviços.
            Ainda, a Lei de Terceirização determina ainda que ao trabalhador temporário não se aplica o contrato de experiência da CLT, em relação à tomadora de serviços e que esta é subsidiariamente responsável pelas obrigações trabalhistas referentes ao período em que ocorrer o trabalho temporário, exceto no caso de falência da empresa de trabalho temporário, quando a tomadora será solidariamente responsável pelo recolhimento das contribuições previdenciárias, remuneração e indenização previstas na própria lei, no tocante ao tempo que o trabalhador esteve sob suas ordens.
            Por fim, em relação ao trabalho temporário, a Lei 13.429/17 determina que competirá à Justiça do Trabalho dirimir os litígios entre as empresas de trabalho temporário e seus trabalhadores (o que a nosso ver já era algo óbvio, uma vez que a Constituição Federal determina que compete à Justiça do Trabalho processar e julgar as ações oriundas da relação de trabalho e que a Lei 6.019/74 não se aplica às empresas de vigilância e transporte de valores, que possuem regra própria (Lei 7.102/89).
Além do trabalho temporário, conforme já dito anteriormente, a Lei 13.429/74 trouxe a terceirização – por isso que a referida lei tem a alcunha de “Lei da Terceirização”. Terceirização é uma modalidade de organização estrutural que permite a uma empresa transferir a outra suas atividades-meio, proporcionando maior disponibilidade de recursos para sua atividade-fim, reduzindo a estrutura operacional, diminuindo os custos, economizando recursos e desburocratizando a administração.
A nova lei trouxe a figura de duas novas formas de empresa: as empresas prestadoras de serviços a terceiros e as contratantes. As principais são as chamadas empresas terceirizadas, pois suas funções é destinar trabalhadores para prestar à contratante serviços determinados e específicos, de forma não temporária. Já a empresa contratante é aquela que receberá os funcionários terceirizados e onde os mesmos exercerão suas atividades.
A legislação determina que fica a cargo das empresas prestadoras de serviços a terceiros contratar, dirigir e remunerar seus funcionários, não necessitando que seus funcionários obedeçam às ordens emanadas pela empresa contratante. Além disso, a Lei 13.429/17 determina que não configura vínculo empregatício entre os funcionários da empresa prestadora de serviços e a contratante, revogando-se o inciso III da Súmula 331 do TST[2] e que a empresa prestadora de serviços deverá possuir os seguintes requisitos para funcionar, ipsis litteris:

Art. 4º-B: [...]
I - prova de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ);
II - registro na Junta Comercial;
III - capital social compatível com o número de empregados, observando-se os seguintes parâmetros:
a) empresas com até dez empregados - capital mínimo de R$ 10.000,00 (dez mil reais);
b) empresas com mais de dez e até vinte empregados - capital mínimo de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais);                 
c) empresas com mais de vinte e até cinquenta empregados - capital mínimo de R$ 45.000,00 (quarenta e cinco mil reais);                
d) empresas com mais de cinquenta e até cem empregados - capital mínimo de R$ 100.000,00 (cem mil reais); e                
e) empresas com mais de cem empregados - capital mínimo de R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais). (BRASIL, 2017)  

Assim, se torna impossível a equivocada ideia de que o empresa contratante poderá demitir seus funcionários e determinar que os mesmos voltem como pessoas jurídicas.
Além disso, conforme já determinava a própria Súmula 331 do TST, a empresa contratante será subsidiariamente responsável pelas obrigações trabalhistas dos trabalhadores responsáveis.
Por fim, a Lei de Reforma Trabalhista (Lei 13.467/17) modificou a Lei 6.019/74 – apenas quatro meses após o advento da Lei 13.429/17 -, determinando expressamente que o contrato firmado entre a prestadora de serviços e a contratante pode ser tanto em relação às atividades-meio quanto as atividades-fim – o que antes era silente pela Lei de Terceirização, que não proibia nem permitia expressamente. Para findar com as dúvidas, a Lei de Reforma Trabalhista passou a permitir expressamente, permitindo também que as empresas prestadoras de serviço igualem o salário dos terceirizados com os não-terceirizados.
Além da modificação supramencionada, a Lei de Reforma Trabalhista passou a determinar expressamente que não se pode configurar como empresa prestadora de serviços a pessoa jurídica cujos donos ou sócios tenham prestado serviço à contratante como empregado ou trabalhador sem vínculo empregatício, no prazo de 18 (dezoito) meses, exceto se forem aposentados. Da mesma forma, o empregado demitido não poderá prestar serviços para a empresa que o demitiu pelo prazo de 18 (dezoito) meses, como empregado de empresa prestadora de serviços.
Vale salientar, ao final, que a Lei de Reforma Trabalhista só passará a vigorar no mês de novembro de 2017 (120 dias da data de sua publicação; art. 6º da Lei 13.467/17), enquanto que a Lei de Terceirização não teve, conforme já explicado, período de vacatio legis.


[1]O contrato por prazo determinado só será válido em se tratando: I - de serviço cuja natureza ou transitoriedade justifique a predeterminação do prazo; II - de atividades empresariais de caráter transitório; e III - de contrato de experiência. 

[2] “Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.” (inciso III da Súmula 331 do TST).

quarta-feira, 26 de julho de 2017

Estelionato Religioso

Nos dias atuais, nós vemos cada vez mais igrejas protestantes abriram suas portas, onde pastores clamam verdadeiros discursos perante os fiéis, normalmente cobrando dízimo em troca de uma vida melhor após a morte, vendendo artefatos ditando serem os mesmos milagrosos, dentre outras atividades religiosas em troca de dinheiro. Os artefatos são comumente almofadas que curam prisão de ventre, pregas da cruz de Cristo, sangue de sei-lá-quem que cura câncer, etc.
            Entretanto, a grande maioria destes artefatos e dessas graças estão longe de serem milagrosos, fazendo com que pastores arranquem generosas quantidades de dinheiro de seus fiéis, vendendo-lhes artefatos enganosos, pregando preces que não funcionam, não lhes curando nada daquilo que aos fiéis foram prometidos. E como fica tal questão, à luz do Direito?
            O Código Penal determina, em seu artigo 171, que é crime obter vantagem ilícita, em detrimento alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento, na qual configura a figura do estelionato. Assim, é estelionato toda fraude com o intuito de receber vantagem econômica em detrimento alheio – como os chamados “conto do vigário”, “golpe do bilhete premiado”, “golpe do troco”, dentre outros. Da mesma forma, determina o artigo 283 do mesmo diploma que é crime “inculcar ou anunciar cura por meio secreto ou infalível”, na qual configura o charlatanismo. Dessa forma, configurará charlatanismo quando alguém anuncia que sabe curar doença da pessoa através de um método completamente secreto e que não revelará ao público. Vender produto milagroso não o sendo, cobrar dízimo em troca de espaço no céu, dentre outros – ludibriando, pois, os adquirentes -, configuraria, em tese, crimes de estelionato e/ou charlatanismo, com penas que variam entre um ano e seis anos de prisão.
            Todavia, é necessário ressaltar que a Constituição Federal de 1988 assegurou a liberdade religiosa, transformando-a em direito fundamental e inviolável da pessoa humana (inciso VI do art. 5º da Carta Magna). Assim, qualquer pessoa tem direito de professar sua religião sem interferência estatal, podendo ministrar cultos, construir templos, orar, carregar símbolos religiosos nas ruas, etc. Pode uma mulher islâmica andar pelas ruas usando hijab ou burca; pode haver procissões católicas; pode haver abertura de igrejas para rezas evangélicas, e assim por diante. Dessa forma, a venda de artefatos religiosos configuraria, a princípio, liberdade religiosa, pois, por mais que não haja efeito médico algum, pode haver efeitos religiosos na pessoa, que acredita sinceramente que aquele artefato é milagroso por dádiva divina. Outrossim, pode a pessoa acreditar que doando o seu dinheiro à Igreja estará fazendo um bem, tendo, pois, um lugar no céu após a morte. Então, qual princípio deveria prevalecer – e, portanto, ser aplicado – neste caso? A proteção ao patrimônio particular (a qual o estelionato viola) e à saúde pública (a qual o charlatanismo viola)? Ou a liberdade religiosa?

            Ainda que haja todo um conceito religioso à frente da venda dos artefatos milagrosos, de preces em troca de dízimo, dentre outros, por trás há a intenção destes pastores em se beneficiarem das vendas para auferirem generosos lucros. Há vários e vários pastores extremamente ricos, com dinheiros recebidos pelos fiéis em troca de graças, artefatos milagrosos, dentre outros. Isso é ludibriar o outro. E não pode os pastores usarem suas igrejas como mecanismo de auferir lucro de maneira completamente ilegal. Nestes casos, as igrejas são apenas fachadas para um intento maior – o dinheiro. Estes pastores não estão sob a égide da religião e sim do desejo de lucrar. Portanto, não cabe a estes a proteção constitucional da liberdade religiosa, eis que a religiosidade não está ali presente – e sim o interesse em utilizá-la com o intuito de enganar os fiéis para ganharem lucros. E isso não pode o Direito brasileiro permitir. Por mais que haja religião na venda dos artefatos religiosos, do dízimo em troca das graças, dentre outros, não há por parte dos pastores qualquer fé, qualquer religiosidade no assunto – não podendo, portanto, ser dado a estes a proteção constitucional da liberdade religiosa, devendo, assim, responder normalmente por seus atos.